41-A Igreja e o carnaval: o cristão pode “brincar” o carnaval?
O que é mais natural nesta imagem do que os chifres?
O CRISTÃO pode participar nas festas do carnaval? Muitos fazem essa
pergunta, todos os anos, e há muita confusão a respeito do assunto. A
dificuldade está no fato de que a Igreja não tem uma prescrição oficial a
respeito, ao menos não há documento que fale explicitamente,
textualmente, do carnaval propriamente dito. Ou será que a realidade não
é bem essa?Nós, do apostolado Fiel Católico, cremos firmemente que não
estamos lidando com uma questão assim tão difícil de responder; muito
pelo contrário. Enquanto cristãos, temos direito à hipocrisia? Até que
ponto? E até que ponto é correto dizer que a Igreja silencia quanto ao
tema do carnaval?
É verdade que os documentos oficiais da Igreja não falam literalmente, como dissemos, do carnaval; mas diversos deles tratam sim senhor, da obrigação que temos de evitar as ocasiões de pecado, e do quanto é isso importante. Ocasião de pecado é toda circunstância, coisa, lugar ou pessoa que atiça ou estimula as paixões humanas, seduzindo a pessoa a pecar. – E atire a primeira pedra quem for capaz de afirmar, conscienciosamente, que os bailes e festas de carnaval atuais não são ocasiões mais do que propícias para todo tipo de pecado. Não. Não há como negar que, falando no linguajar atual, os bailes e festas de carnaval que temos hoje são “mega-ocasiões” para o pecado! Vemos assim como a questão não é tão difícil como parece, nem tão complexa. Na realidade, estamos tratando de coisa muito simples.Verdadeiramente, segundo a Sã Doutrina de sempre da Igreja Católica, sob o patrocínio de Santo Afonso de Ligório, expor-se a uma ocasião próxima de pecado mortal, que se poderia evitar, já é pecado mortal de imprudência.
E é por esse caminho que vemos, hoje, a cristandade como a derreter-se,
desintegrar-se, aniquilar-se… Como cera próxima ao fogo. A necessária
reforma das consciências cristãs requer necessariamente que se restitua
às almas o horror pelas ocasiões próximas de pecado. Não é possível
querer ser cristão e continuar brincando com a própria salvação eterna,
expondo-se aos sutis laços do inferno, que são as ocasiões próximas de
pecado. Assim pergunta a Sagrada Escritura: “Pode alguém caminhar sobre
brasas sem queimar os próprios pés?” (Pr 6,28).
E como já dizia um velho e experiente diretor de almas: “Em fugir ou não fugir da ocasião consiste o cair ou não cair no pecado”
(Pe. Manuel Bernardes, Sermões e Práticas, II). E este mesmo autor faz
uma curiosa observação: “Somos muitas vezes nós que tentamos ao diabo!
Por quê? Porque somos nós os que buscamos a ocasião, os que chamamos por
ela; e buscar a ocasião em vez de ela nos buscar é, em vez de o diabo
nos tentar a nós, tentarmos nós ao diabo…” (Idem).
Nada auxilia tanto os planos do demônio quanto as ocasiões de pecado.
São estas como que as emboscadas onde a todo momento aquela antiga
serpente prepara o bote. Logo não há outra alternativa para o homem: ou a
fuga das más ocasiões, ou a morte espiritual.
Adverte Sto. Afonso Maria de Ligório:
“Da obrigação de evitar as ocasiões perigosas – Um sem número de
cristãos se perde por não querer evitar as ocasiões de pecado. Quantas
almas lá no inferno não se lastimam e queixam: ‘infeliz de mim! Se
tivesse evitado aquela ocasião, não estaria agora condenado por toda a
eternidade!’. Falando aqui da ocasião de pecado, temos em vista a
ocasião próxima, pois deve-se distinguir entre ocasiões próximas e
remotas. Ocasião remota é a que se nos depara em toda a parte e que
raramente arrasta o homem ao pecado. Ocasião próxima é a que, por sua
natureza, regularmente induz ao pecado. Por exemplo, se acharia em
ocasião próxima um jovem que muitas vezes e sem necessidade se entretêm
com pessoas levianas de outro sexo. Ocasião próxima para uma certa
pessoa é também aquela que já a arrastou muitas vezes ao pecado (…).O
Espírito Santo diz: ‘Quem ama o perigo nele perecerá’ (Eclo 3,27).
Segundo Sto. Tomás, a razão disso é que Deus nos abandona no perigo
quando a ele nos expomos deliberadamente ou dele não nos afastamos. S.
Bernardino de Sena diz que dentre todos os conselhos de Jesus Cristo, o
mais importante e como que a base de toda a religião, é aquele pelo qual
nos recomenda a fuga da ocasião de pecado.
(…) O demônio deseja que te entretenhas com a tentação, porque então
torna-se-lhe fácil a vitória. Deves, porém, fugir sem demora, invocar os
santos nomes de Jesus e Maria, sem prestar atenção, nem sequer por um
instante, ao inimigo que te tenta. S. Pedro nos afirma que o demônio
rodeia cada alma para ver se a pode tragar: ‘Vosso adversário, o
demônio, vos rodeia como um leão que ruge, procurando a quem devorar’
(1Pd 5,8). S. Cipriano, explicando essas palavras, diz que o demônio
espreita uma porta por onde possa entrar na alma; logo que se oferece
uma ocasião perigosa, diz consigo mesmo: ‘eis a porta pela qual poderei
entrar’, e imediatamente sugere a tentação. Se então a alma se mostrar
indolente para fugir da tentação, cairá seguramente, em especial se se
tratar de um pecado impuro. É a razão por que ao demônio mais desagradam
os propósitos de fugirmos das ocasiões de pecado, que as promessas de
nunca mais ofendermos a Deus, porque as ocasiões não evitadas tornam-se
como uma faixa que nos venda os olhos para não vermos as verdades
eternas, as formas das coisas santas e as promessas feitas a Deus.
Quem estiver enredado em pecado contra a castidade, deverá, para o
futuro, evitar não só a ocasião próxima, mas também a remota, enquanto
possível, porque em tal se sentirá muito fraco para resistir. Não nos
deixemos enganar pelo pretexto da ocasião ser necessária, como dizem os
teólogos, e que por isso não estamos obrigados a evitá-la, pois Jesus
Cristo disse: ‘Se teu olho direito te escandaliza, arranca-o e lança-o
de ti’ (Mt 5, 29). Mesmo que seja teu olho direito deverás arrancá-lo e
lançar fora de ti, para que não sejas condenado. Logo, deves fugir
daquela ocasião, ainda que remota, já que, em razão de tua fraqueza,
tornou-se ela uma ocasião próxima para ti.
Antes de tudo devemos estar convencidos que nós, revestidos de carne,
não podemos por própria força guardar a castidade; só Deus, em Sua
imensa bondade, nos poderá dar força para tanto.
É verdade que Deus atende a quem Lhe suplica, mas não poderá atender à
oração daquele que conscientemente se expõe ao perigo e não o deixa,
apesar de o conhecer, pois, como diz o Espírito Santo, quem ama o perigo
perecerá nele (Eclo 3,27).
Ó Deus, quantos cristãos existem que, apesar de levarem uma vida
piedosa, caem finalmente e obstinam-se no pecado, só porque não querem
evitar a ocasião próxima do pecado impuro. Por isso nos aconselha S.
Paulo (Fil 2, 12): ‘Com temor e tremor operai a vossa salvação’. Quem
não teme e ousa expor-se às ocasiões perigosas, principalmente quando se
trata do pecado impuro, dificilmente se salvará.”
(LIGÓRIO, Santo Afonso Maria de. Escola da Perfeição Cristã, Compilação
de textos do Santo Doutor pelo padre Saint-Omer, CSSR, 4ª edição, Ed.
Vozes, Petrópolis: 1955, páginas 44-48)
Sobre a festa do carnaval
Muitos imaginam que o carnaval tem origem brasileira, mas a festa
existe desde a Antiguidade. De fato, não se conhece ao certo a origem do
carnaval, assim como a origem do nome. Historicamente é uma festa
popular coletiva, transmitida através dos séculos como herança de
antiquíssimas festas pagãs, realizadas entre 17 de dezembro (Saturnais –
em honra a deus Saturno, na mitologia grega) e 15 de fevereiro
(Lupercais – em honra a deus Pã, na Roma Antiga).
Dentre os pesquisadores, correntes diversas adotam prováveis origens
diferentes. Há os que defendem que a comemoração do carnaval tem suas
raízes em alguma festa primitiva, de caráter orgíaco (relativo a orgia),
realizada em honra do ressurgimento da primavera. Em certos rituais
agrários da Antiguidade (10.000 aC), homens e mulheres pintavam rostos e
corpos, e entregavam-se a dança, a festa e a embriaguez. Outros autores
acreditam que o carnaval tenha se iniciado nas alegres festas do Egito,
com os festejos em honra à deusa Ísis (2000 aC).
O carnaval pagão começa quando Pisistrato oficializa o culto ao deus
Dionísio na Grécia, no século VII aC. O primeiro foco de grande
concentração carnavalesca de que se conhecem fontes seguras acontecia no
Egito: era dança e cantoria em volta de fogueiras. Os foliões usavam
máscaras e disfarces simbolizando a inexistência de classes sociais.
Depois, a tradição se espalhou por Grécia e Roma, entre os séculos VII e
VI dC. Nessa época, sexo e embriaguez já se faziam presentes na festa. –
Em seguida, o Carnaval chega em Veneza para, daí, se espalhar pelo
mundo. Diz-se que foi lá que a festa tomou as características atuais:
máscaras, fantasias, carros alegóricos, desfiles.
No início da Era Cristã, a Igreja deu uma nova orientação às
festividades do carnaval. Ao contrário do que se diz, o catolicismo não
“adotou” o carnaval, mas deu à festa popular um novo sentido, já que ela
foi anexada ao calendário religioso antecedendo a Quaresma. A festa
agora terminava em penitência, na dor de quarta-feira de Cinzas.
Como se vê, lamentavelmente, apesar de a Igreja ter sempre tentado dar
um novo sentido à festa da carne, não obteve um grande sucesso nisso. Se
formos comparar o que ocorre hoje com as festas que ocorriam na
antiguidade pagã, não vemos grandes diferenças. Orgias, embriaguez,
brigas, mortes… Excessos de todo tipo, na realidade, parecem ocorrer
hoje em escala ainda maior.
Como cristãos, somos sempre chamados a santidade, e o sentido da
palavra santo é “o outro”. Santo é aquilo/aquele que está separado do
impuro ou do profano para o serviço de Deus. Não podemos, em situação
alguma, fazer parte de algo que está em oposição a Deus. O carnaval não é
exceção.
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